terça-feira, 21 de julho de 2009


Ela se olhava no espelho. Os olhos azuis carregando em si um olhar distante, como se estivesse com o pensamento em uma época remota. Uma época onde os risos eram fáceis e sinceros, os abraços eram afagos eternos e o desejo pela liberdade tinham um gosto convidativamente doce. Uma época a qual ela não pertencia mais, ela pensou enquanto olhava sua face fixamente. Não suportou olhar-se por mais de cinco segundos e levantou-se saindo do quarto.Se dirigiu para o corredor, onde as luzes dos relampagos afugentavam as sombras por breves momentos. Pelas janelas largas de vidro ela podia ver a chuva violenta que caia sobre a cidade adormecida. Ela podia usar a chuva e aproveitar que ja era tarde da noite para ir se deitar, mas não. Ela queria ficar mais um pouco e aproveitar a sobriedade da chuva e o modo que coisas passadas estavam voltando em cenas de filme em sua mente. Ela conhecia a casa como a palma de sua mão, e já andava por ela no escuro sem se esbarrar em portas e paredes. Dois anos deram a ela essa experiencia. Lembrou da vez em que havia entrado na casa pela primeira vez. Os móveis novos, a novidade de um lar de alegria e amor que estava se formando para ela. Mas não. A casa hoje estava fria e solitária, assim como ela. Já estava no final do corredor quando se virou e olhou para o seu quarto e viu a cama de casal e teve vontade de chorar. Por um momento pensou que suas lagrimas não ajudariam em nada e só a fariam mais patética no meio da casa, a noite, apenas com o vestido longo de seda preta que usava para dormir e... sozinha, Ninguém para abraçá-la, beijá-la e dizer que tudo estava bem e que melhoraria. Ele não estava mais lá.Foi mais um ato impulsivo do que coragem que a fez correr para abrir a porta e correr para o frio e a chuva que assolavam o jardim. Ela sentiu um forte calafrio percorrrer o corpo quando o vento forte e as gotas de chuva se lançaram para ela. Fechou os olhos diante da sensação e ficou parada apenas para não se sentir pior. De repente foi como se ele estivesse ali com ela. Ela ja não sentia mais os grossos pingos que castigavam sua branca pele, nem o frio desolador que fazia seus pêlos arrepiarem. Ela sentia ele.Eles se olharam. Ambos sabiam que a partir da meia-noite seria o aniversário da morte dele. Mas um ano que ela não sentia ele em seus braços, em sua rotina, nela, apenas nela. Era dificil respirar sem ele. Ela dificil de sentir sem ele. Era tudo muito triste sem ele. E agora ele estava ali com ela, no meio da chuva, do jardim, no meio da casa que pertencia a eles. Ela sentiu uma lagrima se misturar à água da chuva que lavava seu corpo. Ele olhava pra ela com o mesmo olhar apaionado que fazia tudo nela ferver de amor e paixão. Ele acariciou sua face molhada enquanto sorria e a olhava nos olhos com o mesmo carinho.de sempre. De repente ele disse: "Não chore, minha amada! Não chore por algo que não acabou. Nosso amor permanece conosco. Eu continuo a te amar e a existir em cada coisa que construimos juntos. Não chore, amada minha; não mais. Eu nunca serei passado. Eu permanecerei vivo em seu coração para sempre. Cuidarei para sempre de você. Pela eternidade!" Beijou-a docemente... e desapareceu.Ela abriu os olhos. Ajoelhou-se onde estava e agradeceu a Deus pelo amor que tinha salvado ela de tantas coisas ruins. Pelo amor que em vida permitiu que ela tivesse alegrias, glorias e tantas sensações puras, peculiares e unicas. Agradeceu, apenas. Levantou-se e foi para dentro da casa, deixando que o futuro a acolhece com o mesmo afetuoso abraço que ela se despedia das dores do passado.